
via Prato Fundo (o post é grande, mas vale e muito, a pena)
Fiquei sabendo do produto por causa da campanha impressa numa revista de grande circulação no país. Dois pontos básicos chamaram a atenção: estar na mesma foto um dos chefs mais importantes do Brasil acompanhado de caldos industrializados. Convenhamos, não é lá uma associação muito comum (ou não deveria ser) quando se fala de alta gastronomia, não?
Sabem do que estou falando: Alex Atala emprestando sua marca para uma linha de produtos de caldos prontos da Knorr. Ação parecida com a realizada em outro países com diferentes chefs de cada localidade. No Reino Unido é com Marco Pierre White.
Para tirar a prova dos 9 e ter embasamento para fala qualquer coisa o mínimo que se preza é experimentar e conhecer o produto. Ética você vê por aqui, 
Para esse experimento segui dois caminhos: 1) analisar o produto na embalagem; 2) seguindo as recomendações de uso. Antes que digam, não. Ninguém me mandou nada, tudo comprado por mim. Teste totalmente espontâneo.
Material

Adquiri uma embalagem de cada sabor disponível: carne, legumes e galinha. Cada uma possui dois potinhos de 33g, sendo que cada pote equivale à dois cubos.
A quantidade de sódio é sempre um problema, segundo o fabricante essa apresentação em potinho possui 25% menos sódio quando comparado com a versão convencional, suponho que sejam os cubos. A tabela abaixo representa as quantidades no potinho de 33g. Para chegar a esses números usei a tabela nutricional de cada um dos produtos e realizei uma regra de três básica.

Para legumes e galinha, a embalagem informa que não possui quantidades significativas de carboidratos.
Importante lembrar que a Organização Mundial da Saúde (OMS) preconiza que a ingestão diária de sal seja menor que 5g ou menor que 2g de sódio (veja Reducing salt intake in populations e Diet, nutrition and the prevention of chronic diseases). Sim, são diferentes e para entrar nesse assunto iria falar de química, molaridade, massa atômica… assuntos que me encantam, mas todo mundo torce o nariz.
Assim, se você comer uma preparação inteira feita com o potinho terá consumido mais do que a quantidade de sódio recomendada para um dia inteiro. Isso sem contar outros alimentos ingeridos juntos ou separados. Pode soar um pouco extremista, mas na hora do vamos ver é fácil, fácil que isso aconteça, não?
Carne

Ingredientes: água, sal, açúcar, gordura e carne bovina, cenoura, espinafre, alho poró, alho, cebola, pimenta branca, realçadores de sabor glutamato monossódico e inosinato dissódico, aromatizantes, espessantes goma xantana e goma jataí, acidulante ácido cítrico e corantes caramelo IV e beta-caroteno. Contém glúten, traços de leite.
Sem dissolver
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Cor: marrom escuro
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Aspecto: gelatinoso
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Odor: característico de carne, lembra carne de panela (músculo)
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Sabor: característico de carne, mas o salgado predomina
Dissolvido em água: o líquido fica entre um marrom-âmbar com partículas suspensas e camada de gordura visível na superfície. Tanto o cheiro quanto o sabor ficaram menos pronunciados, mas ainda sim característicos de carne, principalmente o cheiro: carne de panela. A percepção do salgado diminui, porém vem logo depois do gosto de carne.
Para ser a base de uma sopa: ok. Base para risoto: creio que não, poderia ficar salgado e agregaria cor.
Legumes

Ingredientes: água, sal, cenoura, óleo vegetal, alho poró, espinafre, pimentão, aipo, cúrcuma, alho, pimenta branca, realçadores de sabor glutamato monossódico e inosinato dissódico, aromatizante, espessantes goma xantana e goma jataí e corantes beta-caroteno e caramelo IV. Contém glúten.
Sem dissolver
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Cor: amarelo escuro-queimado
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Aspecto: espesso sem ser gelatinoso
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Odor: vegetal, mas artificial
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Sabor: extremamente salgado e artificial, o sal quase sobrepõe o gosto dosvegetais
Dissolvido em água: os aromas mais presentes era de alho e de aipo e alguma coisa de alho-poró, mas é difícil saber de fato. Coloração amarelada bem opaca. Já o sabor, o salgado é o predominante e as notas vegetais se perdem rapidamente. Tanto o cheiro quando gosto a lembrança primordial remete aos cubos normais e a sua artificialidade, dissolvido ou não.
Para ser a base de uma sopa: regular-baixa. Base para risoto: salgado.
Galinha

Ingredientes: água, sal, gordura e carne de galinha, óleo vegetal, cenoura, açúcar, espinafre, alho, pimenta branca, realçadores de sabor glutamato monossódico e inosinato dissódico, aromatizante, espessantes goma xantana e goma jataí e corante beta-caroteno. Não contém glúten. (Nota: a embalagem diz que não tem glúten, de qualquer maneira, quer for celíaco deve ler a lista se for comprar).
Sem dissolver
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Cor: amarelo quase gema
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Aspecto: bem gelatinoso
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Odor: característico de frango, de carne/carcaça velha e muito cozida
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Sabor: característico de frango e gorduroso, frango que cozinhou demais e salgado
Dissolvido em água: amarelo, menos opaco que o de legumes. Tem cheiro de frango, mas de carne que foi cozida demais, sabe quando você cozinha frango, não come tudo e cozinha de novo? Então, é quase isso. Lembra canja também, e isso não é bom. O gosto se assemelha bem com o cheiro dele, primeiro o gosto de frango e gordura pronunciado e depois vem o sal.
Para ser a base de uma sopa: regular. Base para risoto: salgado.
Veredito

Eu usaria? Provavelmente não, é muito salgado. Quando preciso de caldo (sopa, risoto…) faço o meu próprio nem que seja na hora. Não é como a escola clássica manda, claro. Normalmente é de legumes — é mais rápido — com o que tem na geladeira: cebola, alho, cenoura e especiarias (cravo, canela, folha de louro, pimenta em grão). É uma água aromatizada suave, porém posso controlar a quantidade de sal que desejo.
Se tivesse que escolher para uso seria: carne e frango. Ruim, de tudo, não são. Mas excelentes também não. Em comparação com o cubo, o potinho sai na frente para esses dois sabores.
Já o legumes foi reprovado na minha análise sensorial, não gostei nada dele. Dos 3, o mais suave em relação ao sal é o de carne o que confere, ele tem menos sódio que os outros. Mesmo o de galinha e legumes tendo quantidades de sódio próximas, o de legumes ainda é o mais salgado para mim.
Foram utilizados em preparo de alimentos também, claro, para saber como se comportavam. Ao menos para mim, o salgado ficou com efeito retardado. Leia-se: passei o dia bebendo água, muita água.
Agora, o problema básico de sempre: empresas querem passar a imagem de um produto “caseiro” quando na realidade não possui essa propriedade, além da tentativa velada de fazer uma ligação com natural. Só o fato de serem processados por indústria já o tiram dessa categoria, né?
Além, quando esses fundos são feitos em casa/restaurantes (do modo clássico) não é acrescido espessantes como goma xantana ou goma jataí, e muito menos corantes. A consistência que os produtos tem é proveniente desses espessantes, ficou parecido? Ficou, mas não porque foram reduzidos por horas. Ou seja, “não é feito como em casa.”
Claro, lembrando que você e eu não somos o target do produto. Bom, uma parcela até pode ser, não saberia dizer se o consumidor-médio conhece o garoto propaganda deles. Deve conhecer, né? Pesquisa básica de mercado com certeza foi feita.
Usar em casa um atalho desses pode ser levado em consideração em alguns momentos, pois nem todo mundo tem disposição de realmente fazer fundos/caldos… mas numa cozinha de alta gastronomia. Não sei o senhor Atala, mas seu colega de profissão lá do Reino usa nos seus restaurantes.
Não sou ingênuo de pensar que restaurantes não façam uso de caldos industrializados, uma coisa é você suspeitar e outra é ter certeza. Ao menos, eu não ficaria nada contente em saber que o prato mega caro foi feito com cubinhos. Se fui até um estabelecimento de um status diferenciado, quero que a comida também o seja, caso contrário ficaria em casa.
Considerações Finais
Talvez, posso estar equivocado… mas acredito que exista um erro nas embalagens. Em todos os modelos há a indicação que o produto é 0% gordura. Ou seja, isso quer dizer que em 100g de produto não tem nenhum grama de gordura (ou máximo de 0,5g em 100g pela legislação). Porém, a afirmação é contradita pela tabela nutricional, na listagem de ingredientes e é visível quando se usa o produto no modo indicado

Na tabela impressa na embalagem de carne, por exemplo, informa: em 8,25g do caldo concentrado tem 0,4g de gorduras totais. Se em míseros 8g já tem, imagine quanto vai ter em 100g de produto. Precisa imaginar não, vai ter: 4,84g de gorduras totais. Acredito que nem seja possível usar a RDC nº360, 23/12/03 e a Portaria nº27, 13/01/98 como explicação.
Muitos sites de marketing/releases/RP tem propagado essa informação dos 0%… tudo bem que o texto vem pronto da fonte, mas… revi e revi os cálculos não tem como ser 0% de gordura.
Analisando o conjunto, suponho que faltou um adjetivo ali: trans. Pode ser que tenha alguma brecha na legislação que permita tal afirmação, não sei. O jeito é esperar para ver o que acontece, uma vez que questionei o SAC da Knorr/Unilever.
Atualização em 28/06/10
O SAC da Knorr me respondeu o seguinte:

Errado, não está. Mas a maneira como é divulgado na embalagem, ao menos para mim, é dúbio.
E você, vai usar?
meio gay, mas devo dizer que me apaixonei pelo Prato Fundo, excelente blog! Parabéns!